Internet - O Colapso
O Colapso pela falta de endereços e sua solução

A Rede Mundial que conhecemos por Internet opera de modo ininterrupto pelo fato de todos os sistemas participantes seguirem um conjunto de regras, criadas e aprovadas via consenso em um foro mundial denominado IETF (Internet Engineering Task Force), que divulga estas regras em documentos chamados RFC (Request For Comments). O protocolo, ou regra, responsável pela identificação dos equipamentos e transmissão dos dados é o IP (Protocolo Internet), que empresta seu nome à rede.
Todavia, mesmo com toda organização e consenso global, a rede sofreu uma tragédia anunciada em 2011, o colapso por falta de endereços para conetar novos participantes, que teve como principais coadjuvantes ISP (provedores de acesso, na maioria operadoras de telecomunicações), governos e fabricantes.
O IP versão 4 foi projetado na década de 1970 e definido pela RFC 791 (1981), utiliza 32 bits e possui a capacidade de 4.294.967.296 endereços, inicialmente divididos em três classes de tamanhos fixos:
- Classe A: 128 redes, ou blocos, com 16.777.216 endereços;
- Classe B: 16.384 redes com 65.536 endereços;
- Classe C: 2.097.152 redes com 256 endereços.
A Internet foi liberada para utilização comercial pelo Governo dos Estados Unidos em 1993, com pouco mais de 2 milhões de hosts (equipamentos conectados), estudos já apontavam que o seu ritmo de crescimento a levaria ao colapso por falta de endereços, pois a maneira de distribuição em classes gerava um grande desperdício, uma rede com demanda de 260 hosts era obrigada a obter um bloco Classe B e desperdiçar mais de 65 mil endereços, por exemplo. Foram discutidas diversas estratégias para solucionar este cenário e, como resultado inicial, o IETF publicou:
- 1996 - RFC 1918, reserva endereços para uso exclusivo em redes locais, que não podem ser utilizados na Internet, nas Classes A, B e C, com 16.777.216, 1.048.576 e 65.536 endereços, respectivamente;
- 1997 - RFC 2131, protocolo DHCP, permite obter, de forma dinâmica e automática, um endereço IP, com todas as informações necessárias à conexão;
- 1998 – RFC 2460, proposta de nova versão para o Protocolo Internet, IP versão 6 (IPv6), eleva em 79 octilhões de vezes o número de endereços.
- 2001 - RFC 3022, técnica paliativa NAT (Network Address Translation), que permite que vários hosts em uma rede definida na RFC 1918 possam utilizar um único IP válido na Internet;
- 2006 - RFC 4632, CIDR, elimina as classes de endereços, evitando o desperdício.
A técnica DHCP, embora auxilie inicialmente na questão de falta de endereços, não foi criada com tal objetivo, está relacionada à facilidade de gerenciamento de redes e segurança, principalmente pela popularização de Wi-Fi e Smartphones.
A técnica de NAT mostrou eficiência quanto à economia de endereços, mas por um minúsculo intervalo, ofertando mais inconvenientes do que as vantagens. Os principais problemas são:
- Falsa sensação de segurança, não filtra ou executa qualquer verificação pelos pacotes que passam e dificulta o uso de técnicas de segurança como o IPsec;
- Impossibilita o uso de ferramentas para rastrear o caminho de pacotes;
- Exige grande poder de processamento do dispositivo onde é executada, elevando custos;
- Possui baixa escalabilidade, limita drasticamente o número de conexões simultâneas;
- Quebra o princípio fundamental da Internet, a comunicação direta entre dois equipamentos. Aplicações como P2P (peer-to-peer), VoIP (voz sobre IP), VPN (Virtual Private Network) apresentam dificuldades de funcionamento.
A NAT, mesmo unida à técnica CIDR, reduziu em apenas 14% a demanda por endereços à IANA, entidade internacional responsável pelo controle e distribuição de endereços na Internet.

O IETF publica, em 2008, a RFC 5211, um informativo sobre a Transição da Internet para o IPv6 (Internet Protocol version 6), mas o IPv6 permanece ignorado em diversos países, pois sua implementação demanda custos com a qualificação de mão-de-obra e substituição de equipamentos, fabricantes encorajam os ISP no sentido de uso do NAT em suas redes (CGNAT), algo totalmente paliativo que não soluciona a falta de endereços e causa mais problemas.
As técnicas paliativas foram completamente incapazes de evitar o colapso anunciado e, em 03 de fevereiro de 2011, a IANA anuncia que seu estoque de endereços IP versão 4 terminou, ou seja, não existem mais endereços disponíveis, a Internet não pode se expandir devido à falta de endereços, o que torna urgente e inevitável, a adoção da nova versão do protocolo, o IPv6, definido em 1998.
A tragédia anunciada se cumpre e a Rede Mundial torna-se incapaz de conectar novos participantes a nível global, até que a inevitável necessidade da adoção do IPv6 seja atendida por todos os seus participantes, de forma a manter a isonomia nas conexões e restaurar o princípio fim a fim, indispensável para o correto funcionamento de diversas aplicações, garantindo a democratização, a segurança e a neutralidade da rede.
Referências:
Comitê Gestor da Internet no Brasil - IPv6.br:
IPv6: Histórico e motivação - Curso IPv6 básico - 2012
IPv6: Endereçamento - site IPv6.br - 2018
Internet Engineering Task Force (IETF):
RFC 1918 – Address Allocation for Private Internet, 1996.
RFC 2131 – Dynamic Host Configuration Protocol, 1997.
RFC 2460 – Internet Protocol, Version 6 (IPv6) Specification, 1998.
RFC 2993 – Architetural Implications of NAT, 2000.
RFC 3022 – Traditional IP Network Address Translator (traditional NAT), 2000.
RFC 3027 – Protocol Complications with the IP Network Address Translator, 2001.
RFC 4632 – Classless Inter-domain Routing (CIDR): The Internet Address Assigment and Agregation Plan, 2006.
RFC 5211 – An Internet Transition Plan, 2008.